analy

5 de mai. de 2008

O Sonho de Cassandra

Ir ao cinema para ver o novo filme de Woody Allen é como rever um velho amigo. Uma vez por ano esse nosso companheiro-cineasta reflete sobre temas que o perseguem e que já foram explorados anteriormente em sua vasta filmografia.

Diferente do que muitos críticos acreditam, O Sonho de Cassandra não é mera repetição, ou uma “sub-obra” na carreira de Allen. Mas sim, um novo degrau na investigação e enfrentamento de dilemas pessoais do cineasta como a Morte, a Ética e o mundo contemporâneo. Eis a trama: Dois irmãos precisam urgentemente de dinheiro e o método mais fácil de conseguir é matando o inimigo de um tio rico.

Em suas entrevistas, Woody Allen é o primeiro a admitir que não se acha um diretor apto para realizar filmes “políticos” ou de “crítica” a algum tema atual. Porém, tanto em seu penúltimo filme, Match Point (2005), como no que acaba de estrear, Allen prova ser um cineasta muito atento ao mundo globalizado em que vive e capaz de apontar suas contradições. Sob que Ética viver num mundo obcecado pelo dinheiro? Quais os limites que a sociedade têm ultrapassado em favor do sucesso nos negócios?

Essas são algumas das questões que permeiam O Sonho de Cassandra. Uma excepcional obra cinematográfica. De um diretor com extremo domínio da técnica e da linguagem do Cinema. A cena na qual o assassinato é posto em pauta na trama, e na vida dos irmãos, é simplesmente brilhante nesse sentido.

Como em Crimes e Pecados (1989) e em outros de seus filmes, temos o assassinato, a culpa, os dilemas de Raskólnikov que tanto fascinam o diretor nova-iorquino. O que faz, talvez, de O Sonho de Cassandra um filme tão forte é o ingrediente de tragédia que move a trama até o desenlace.

É fascinante acompanhar tão rica obra artística. Em Crimes e Pecados, o personagem (também assassino) de Mantin Landau conseguia empurrar sua culpa para debaixo do tapete, o que nos dava um nó interior em nossas convicções religiosas e dramatúrgicas. Em Match Point , por sua vez, o arrivista Cris, após o assassinato de sua amante inconveniente, parece ter perdido parte de sua humanidade num final amargo, dilacerante.

Agora, os irmãos Colin Farrel (excepcional) e Ewan Mcgregor pagam por seus crimes de maneira inevitável. Mais do que uma simples lição de moral como “o crime não compensa”, Woody Allen nos dá um testemunho lúcido e crítico sobre o estágio a que chegamos como civilização, na qual a busca pelo dinheiro destrói relações familiares das mais sinceras.

Um grande filme, com certeza. Que poderá entrar no grupo das obras-primas do diretor, junto com Manhattan (1979), A Outra(1988) e Crimes e Pecados (1989).

2 comentários:

Eduardo Gonçalves disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Josa disse...

E aí dú,

Concordo plenamente quando vc diz que Woody Allen "Consegue expressar essas coisas (ética, Moral, etc.) de forma simples".

Allen é um homem de grande cultura, mas está longe de realizar obras herméticas ou intelectualóides.

Um dos maiores cineastas vivos.Seu novo filme, uma produção espanhola, estará em Cannes e deve aportar por qui só no ano que vem. Longa espera...

abraços.