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30 de mai. de 2007

Escola do Riso

Não é por acaso que não tenho escrito muito nos últimos dias. Vi, sim, muitos filmes tanto no cinema quanto em dvd, porém nada que me entusiasmasse a escrever. Mas ainda bem que com um pouco de esforço é possível encontrar filmes estimulantes em cartaz na cidade. Acabo de ver o ótimo Escola do Riso no Cinesesc, uma comédia japonesa de Mamoru Hoshi.

O filme se passa no Japão ainda imperial dos anos 1940, e perpassa os entraves entre um dramaturgo ansioso para realizar uma paródia de Romeu e Julieta, e um censor governamental que pretende, com suas inserções e vetos, transformar a peça em um espetáculo de ode á pátria japonesa.

Dilemas de artistas com a censura é um tema universal. E o fato curioso que o filme traz á tona é que muitas vezes a censura pode ser um instrumento de potencialização do talento do artista. Parece paradoxal, mas lembremos das metáforas que o Cinema Novo usava para refletir criticamente o País em pleno regime militar, ou mesmo a sabedoria de Chico Buarque em mascarar canções de protesto com aparência de músicas de amor. Talento e muita criatividade usada para passarem despercebidas as suas obras pela censura da época.

Mas então será que, afinal de contas, a censura pode ter as suas vantagens? De maneira bem-humorada Escola do Riso mostra que sim. E, além disso, vejo no filme uma instigante reflexão sobre o Humor e sobre a Arte!


"O censor dá-se conta de uma humanidade que desconhecia em si próprio"

Porque um Japão em plena II Guerra precisa de risos em um espetáculo teatral? Qual é a utilidade pragmática da Arte? Arte não possui utilidade. Em nosso corrido dia-dia, pense bem, para que ela serve? São perguntas que o filme de alguma forma responde de maneira genial pelo correr da trama e desenvolvimento dos personagens.

No início do filme, o censor tem o orgulho de dizer que nunca riu na vida e crê que é um absurdo investir tempo na produção de algo que só servirá para arrancar risadas da platéia. Porém ao longo do filme, o carrancudo personagem envolve-se no processo criativo da peça, torna-se colega do escritor e, para a surpresa dele próprio, dá a sua primeira série de espontâneas gargalhadas.

O censor dá-se conta de uma humanidade que desconhecia em si próprio. Percebe que por trás da máscara da Instituição que ele representa há um homem capaz de criar...

Muito além de uma simples comédia sobre os contratempos de um artista e um censor, temos um rico ensaio sobre a “utilidade” de algo aparentemente sem função prática alguma: A Arte.

Já virou frase-feita dizer que a comédia é o “horror filtrado pela poesia”. Ela realmente é, mas prefiro a definição de Charlie Chaplin para a importância da arte de fazer rir, e o que também não deixa de ser um pensamento sobre a Arte:

“O humor serve para realçar nosso senso de sobrevivência e para manter nossa sanidade”.

Lindo...

15 de mai. de 2007

Baixio das Bestas

Não acho que seja o melhor, mas o diretor pernambucano Cláudio Assis é com certeza um dos mais viscerais dentre os cineastas em atividade no País. Como disse em entrevista ao Estado de São Paulo, Assis só faz um Cinema que venha do âmago de seu ser.

Baixio das Bestas permite variadas leituras. Num olhar mais periférico, poderíamos pensar o filme como uma denuncia à violência e exploração contra a Mulher, na Zona da Mata nordestina. O filme também é isso. Mas seríamos reducionistas em relação a ele se deixássemos de notar que é também uma obra sobre o ciclo da cana-de-açúcar, a Impunidade, o Brasil e, porque não, um filme que tentar pensar o Homem em sua essência?



Baixio das Bestas: Filme que vem para provocar, intimidar, questionar.

Gosto muito de Amarelo Manga, seu primeiro longa, como também de Baixio das Bestas, um pouco pelo mesmo motivo. O que me fascina na arte de Cláudio Assis é sua coragem em explorar o que há de mais imundo e desprezível no gênero humano. Ele disseca aquelas facetas do nosso ser que preferimos não lembrar, ou simplesmente esquecer. E não o faz como um “voyeur” confortavelmente distante de seus personagens. Assis conhece o mundo em que passeia sua câmera. A força de seus filmes vem, acredito, do conhecimento íntimo que ele tem desses personagens, que expressam tanta podridão ética e moral.

Amarelo Manga e Baixio das Bestas têm os seus pontos de contato, mas são diferentes. Completam-se, talvez. A estrutura em filme-coral permanece, porém o segundo vai visivelmente além do primeiro, tanto esteticamente como conceitualmente.

Pode parecer um paradoxo. Mas mesmo Baixio das Bestas expondo tanta violência, exploração, etc, é um filme com uma qualidade tão límpida de imagem que incomoda. O fotógrafo Walter Carvalho usa a pureza do 35mm não buscando uma "estética da miséria" ou algo gênero, mas para não dar trégua ao espectador da sala de cinema. É um filme que vem para provocar, intimidar, questionar. Grande Cinema!

10 de mai. de 2007

BABEL


O filme dividiu crítica, público, júri de festivais... Isso já é motivo para ver o filme e tentar compreender os motivos de tanta controvérsia. O diretor é o mexicano Alejandro Inarritu, de Amores Brutos e 21 Gramas. O seu terceiro longa, que chega às locadoras em breve, é também sua terceira parceria com o roteirista Gilhermo Arriaga, ganhador do prêmio de melhor roteiro em Cannes por Três Enterros, de Tommy Lee Jones.

Bem, como eu disse, Babel dividiu opiniões. E, claro, dividiu também a minha. Inarritu já provou que tem muito mais talento do que demonstra nesse filme. A pretensão e ousadia podem ajudar muito à uma obra artística (vide Quase Dois Irmãos), mas neste filme a megalomania do diretor desequilibra um projeto de grande potencial, mas que fica aquém do esperado.


Inarritu: Diretor já mostrou que é mais capaz em seus primeiros filmes.

O Cinema é em si uma ilusão. Dentro da sala escura temos projetado na tela 24 fotogramas por segundo, que nos dão a idéia de movimento. Porém, o grande artifício que é a obra cinematográfica não nos impede de viajar nas mais diversas experiências. Mas, ocasionalmente, algum “artifício” da construção fílmica pode incomodar por não nos convencer de alguma forma e “quebrar” a ilusão que temos ao ver um filme.

Acontece isso comigo em Babel. Tem-se um projeto ousado, com um roteiro que deve articular histórias simultâneas em diferentes partes do Globo. Para dar conta de desenvolver todo esse emaranhado de dramas, Babel acaba apelando para “soluções” artificiais de roteiro. Nem todas as relações entre as diferentes histórias são inteiramente verossímeis. O episódio japonês, como disse Luiz Carlos Merten, crítico do Estadão, é o mais frágil de todos eles.
O diretor tem como marca em sua obra desenvolver personagens em situações-limite. E tem em seu 21 Gramas a sua maior obra até agora.
Em mais de 2 horas de Babel, acredito que o único episódio que se sustenta é o do casal americano no Marrocos interpretado por Brad Pitt e Cate Blanchet. No todo falta melhor desenvoltura ao filme e, talvez, um pouco mais de pé no chão para refletir sobre o mundo caótico e não-comunicativo em que vivemos.

5 de mai. de 2007

Homem-Aranha 3

Impossível resistir. Escapei de uma aula da noite na Faculdade e fui conferir no dia de estréia o filme que é o fechamento de um ciclo de amadurecimento na vida de Peter Parker/Homem-Aranha. E vou logo adiantando, Homem-Aranha 3 é o melhor filme da trilogia!

Queria ir numa sala de cinema bem popular para sentir a expectativa da platéia. Fui no Shopping da Lapa. Acompanhado por uma multidão de adolescentes ansiosos que, para o bem ou para o mau, são a razão de ser desse tipo de cinema – evento.

Diferente do que li em algumas críticas sobre o filme, o terceiro episódio está longe de ser “mais do mesmo”. A terceira parte da saga do herói aracnídeo vai além dos dois primeiros filmes, sendo o mais “adulto” de todos eles. O que, acredito, colaborou para surpreender um pouco a platéia do Centerplex Lapa 1 em alguns momentos, que esperava uma aventura mais passageira.

O primeiro filme era sobre a responsabilidade do herói em lidar com seus poderes, o segundo sobre os dilemas em equilibrar uma vida de herói e uma vida pessoal-amorosa atribulada. Nesse terceiro, Parker deve transformar-se num Homem-Aranha ético, adulto. Amadurecido o suficiente para não se tornar somente um vigilante-vingativo, mas sim um homem capaz de ouvir, compreender e perdoar.

Os dilemas do Homem-Aranha são agora de ordem moral


Um simbionte alienígena hospeda-se no uniforme de Aranha, deixando-o mais ágil e poderoso, mas em troca o bicho faz aflorar o lado da personalidade de Peter mais sombrio e obscuro. Homem-Aranha é em boa parte do filme (a melhor) seduzido pelo “lado negro da força...”.

Dando-se conta de quão diferente ele se tornou tomado pelo alienígena, Peter busca redenção numa igreja cristã, local onde temos o prazer de acompanhar a melhor e a mais forte seqüência de toda a trilogia. Os sinos da igreja reverberam e Homem-Aranha coloca-se de joelhos em busca de expiação. É genial!

O filme superou o maior dos temores que eu tinha antes de vê-lo: não conseguir equilibrar o grande número de vilões e sub-tramas. O diretor Sam Raimi não deixa a peteca cair. Também não transforma seu filme em um grande frenesi de ação e efeitos. O ritmo do filme é cadenciado como o dos dois primeiros, dando tempo para que os dramas dos personagens fluam no tempo certo.

Tobey Maguire sempre esteve ótimo na pele do herói, mas Kristen Durst com sua Mary Jane é a alma do filme. Durst, com Maria Antonieta e esse filme, prova-se uma atriz excepcional. Sem exagero. Os anos de passagem da adolescência para a vida adulta foram tão bons para ela como foram para o Homem-Aranha.

É claro que haverá outra seqüência ao filme. A caixa registradora dá as cartas na indústria de Hollywood. Mas tomará um pouco mais de tempo que o habitual dois ou três anos. Homem-Aranha 3 fecha uma jornada de romance, amizade, e sobretudo, da construção do Herói!

2 de mai. de 2007

Proibido Proibir

Depois de um feriado prolongado estamos de volta. Acabo de chegar da sessão de Proibido Proibir, filme do chileno radicado no Brasil, Jorge Durán. Como disse o crítico Carlos Alberto Mattos em um texto sobre o documentário Cartola: Não gostei de não ter gostado de Proibido Proibir...

Tinha bastante expectativa pelo filme. Acompanho sua carreira com interesse desde sua passagem pelo Festival do Rio e na Mostra de São Paulo no ano passado. Além disso, admiro demais o trabalho em outros filmes da trinca principal de atores. Mas o potencial que o filme poderia ter (e acaba tendo, só que em poucos momentos) deixa bem a desejar.

Há talvez um excesso de temas no filme que acabam por se anularem entre si. Amizade, corrupção policial, falta de perspectiva para infância da favela, política, arte... Diversas fatias de nosso Brasil são ilustradas na tela. Um recorte mais definido cooperaria para um resultado mais interessante. Falta ritmo e unidade a Proibido Proibir.

Mas não sejamos injustos, nem tão parciais. Proibido Proibir tem qualidades. Uma delas é que seu diretor confia em seus atores. A eles é dada a possibilidade de se expressarem além do discurso falado. Costuma-se falar demais no Cinema Brasileiro, mas Durán sabe valorizar um olhar, um gesto, a sugestão.



Realidade Nacional, mas sem pessimismo: o “Sol voltará a brilhar...”.

É um filme que deve ser visto, com certeza. Proibido Proibir reflete sobre uma juventude que pode ir além da alienação e do vácuo ideológico que convivemos (que somos?). Os três jovens protagonistas deparam-se com um Brasil contraditório, cheio de seqüelas. Vale a pena lutar por ele? Ficamos com o ceticismo do personagem Paulo (Caio Blat) ou o anseio pela luta de León (Alexandre Rodrigues)?

O filme não é pessimista e a canção final nos convida à esperança de que o “Sol voltará a brilhar...”.