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25 de mar. de 2008

2 dias em Paris


Fui ver 2 dias em Paris com boas expectativas. Julie Delpy é a atriz, roteirista e diretora dessa comédia romântica despretensiosa, e quem me conhece sabe bem que gosto enormemente da atriz no díptico Antes do Amanhecer e Antes do Pôr-do-Sol, de Richard Linklater.

Vi o filme com um amigo e a decepção foi a mesma. Julie faz a francesa que leva o namorado americano (Adam Goldberg) para conhecer seus pais na cidade-luz. O choque cultural do namorado com sua família (e Paris) é a linha-mestra do longa.

A idéia é convencional, mas não quer dizer que por isso a estréia na direção de Delpy esteja fadada ao fracasso. O problema é que ela se utiliza exaustivamente dos clichês e preconceitos mais comuns em relação aos franceses: Taxistas mal-educados, liberalidade sexual, etc. Tudo muito raso, repetitivo e, infelizmente, sem graça nenhuma.

Não sou o primeiro a dizer que fazer Comédia é algo muito mais complexo do que a feitura de um Drama. Delpy não acerta o tom de humor, por mais que seu parceiro de cena, Goldberg, tenha alguns bons momentos. Julie Delpy é realmente francesa e espanta esse seu olhar reducionista sobre sua terra natal. Filme de estreante. Mais sorte na próxima.

17 de mar. de 2008

Sicko - S.O.S. Saúde

Deve ter sido um baque bem grande para Michael Moore a vitória para um segundo mandato do presidente George Bush. Fahrenheit 11/09, filme anterior do diretor, nada mais era do que um grande longa panfletário anti-bush. Lembro que no dia seguinte à vitória do republicano, Moore, procurado pela imprensa, decidiu não se manifestar, tão abalado que estava.

Creio que aquela derrota política para o diretor pode também ter afetado seu cinema. Feito-o repensar a eficácia de seus filmes junto ao público médio americano, seu alvo principal. Pensei nisso enquanto via Sicko-S.O.S Saúde, seu novo documentário que estreou na última sexta, no qual investe contra o sistema de saúde americano.

Sicko-S.O.S Saúde é um bom filme, o menos manipulativo dos filmes de Moore, como também o menos jocoso e no qual a sua postura de show man aparece com mais retidão. Na primeira metade do filme a figura inconfundível do cineasta, como sua narração contundente, pouco aparece, deixando que as histórias das pessoas ludibriadas pelos planos de saúde falem por si. São justamente os melhores momentos do filme.

Os grandes pecados, porém, ainda não resolvidos por Moore são o seu sentimentalismo e patriotismo. Por não controlar muito bem a dosagem desses dois elementos, seu filme perde dosagem de sua força. A música melosa sobreposta aos depoimentos soa totalmente desnecessária. Já era tempo de Moore entender isso.

Já fui um crítico mais severo do cinema do diretor, hoje tento ser mais sereno. Michael Moore tem como principal inimigo o poder das corporações e investe na tentativa de desmascará-las ao grande público, o que acho honrável e necessário.

Esse tom mais ameno com que olho seus filmes também vem da consciência mais límpida de que Cinema é linguagem, um exercício de manipulação de imagens e idéias. O Cinema documentário, diferente do que muitas vezes imaginamos, não traz junto de si um atestado de verdade absoluta. Michael Moore se utiliza dessa linguagem como poucos para defender o que acredita. Seus filmes são “a verdade de Michael Moore”, uma opinião que podemos, ou não, acatar.

Bem, num momento histórico em que se impera a ditadura do politicamente correto e do vácuo ideológico, acho imprescindível que um cineasta faça um filme e tenha os colhões necessários para dizer “Eu acredito nisso ou naquilo”. Esse tipo de postura tem muito faltado a cineastas contemporâneos. Para citar um só exemplo: Carandiru de Hector Babenco. Um filme medíocre e sem coragem de assumir a que veio.

6 de mar. de 2008

Antes de Partir

Sou um amante do Cinema. Com uns nove anos, depois que vi O Garoto num especial da rede Globo, conheci a obra de arte de um humanista que se tornou, a partir dali, um dos meus diretores preferidos. Depois veio a admiração por cineatas como Bergman, Woody Allen e outros. Para mim, no universo da criação, o Cinema vem em primeiro lugar, logo seguido pelo teatro.

Gosto muito de acompanahar montagens dessa "arte do ator" . E pela possibilidade de ver ao vivo alguns atores fundamentais da nossa história, não perdi a oportunidade de ver no palco nomes como Paulo Autran, Othon Bastos, Glória Meneses e tantos mais. De maneira geral, porém, o talento desses gigantes dificilmente é acompanhado por uma dramaturgia do mesmo nível. Quando termina o espetáculo me acostumei a comentar algo como “o ator é fenomenal, mas o texto, a montagem...”.

Há duas semanas estreou Antes de Partir, filme de Rob Reiner com Jack Nicholson e Morgan Freeman. E como muitas das minhas experiências no teatro não espere uma grande obra, tenha somente certeza que acompanhará dois mestres na tela. Elogiar Nicholson é algo quase de praxe, mas sempre vi Freeman também como um dos excelentes intérpretes do Cinema contemporâneo. Acho que sua figura legitima e traz dignidade a muitos filmes às vezes nem tão bons como Robin Hood, Um sonho de liberdade ou Menina de Ouro (que eu acho um horror!).

Em Antes de Partir os dois veteranos são dois pacientes terminais que dividem o mesmo quarto de hospital. Após uma tomada de consciência quanto à finitude da vida, os dois cumprem uma lista daquilo que sonham fazer “antes de partir’...

Conhecendo Hollywood, não é necessário lembrar que os dois trocarão grandes lições de vida ao longo do filme. Ensinamentos da profundidade de um pires. Mas a previsibilidade não estraga alguns bons momentos entre os dois. Seja com o sarcasmo de Nicholson ou na nobreza de Freeman, Antes de Partir é uma “sessão da tarde” de (boa) qualidade.

4 de mar. de 2008

Jogos do Poder


Talvez por estarmos sempre criticando a hegemonia de Hollywood em detrimento da nossa cinematografia, às vezes nos esquecemos do grande número de diretores americanos, digamos, mais politizados. Cineastas mais atentos ao que se passa em seu país e no planeta. Após os ataques às torres gêmeas, por exemplo, foi interessante notar o lançamento de diversos filmes que criticavam a política americana e decisões unilaterais de Bush filho.

O excelente Boa noite Boa sorte, de George Clooney, se voltava para um episódio do marcatismo para pôr em cheque a conivência e apatia da mídia norte-americana diante de uma política externa brutal e mentirosa, como também ao risco da perda das liberdades civis e prol de uma causa “patriótica”.

Steven Spielberg, por sua vez, também foi buscar no passado uma história que servisse de lição aos nossos dias de terrorismo. Munique era claramente uma forma de questionar o uso da violência como forma de retaliação e solução pós-ataque terrorista.

E agora chega aos cinemas Jogos do poder, filme que se detém sobre uma das sementes que originaram a era das trevas (para usar o título do novo filme de Denys Arcand) que vivenciamos no jornal diariamente. Tom Hanks interpreta o personagem verídico Charles Wilson, congressista texano que decidiu aumentar consideravelmente o auxílio aos afegãos que lutavam contra a invasão soviética nos anos 80.

As investidas pessoais e manobras políticas de Wilson soam tão inacreditáveis que o diretor Mike Nichols utiliza um tom quase farsesco na primeira metade do filme, justamente a parcela mais desequilibrada de Jogos do poder.

Na segunda metade do filme, Nichols parece deixar mais claro a que veio. O filme ganha ritmo e as cenas de batalha que possuem como fundo musical um trecho do Messias de Handel são, no mínimo, muito boas. E daí em diante o diretor esclarece que sua maior preocupação é jogar luz sobre os erros de uma política externa americana no período de Guerra Fria, que desembocaria no financiamento e fortalecimento da rede terrorista Al-Qaeda.

Mike Nichols é bem melhor em Closer, seu último filme, mas Jogos do poder, mesmo não sendo inteiramente satisfatório, é respeitável por trazer à tona um episódio tão elucidativo sobre os equívocos dos Estados Unidos em sua empreitada de arrogância em relação ao resto do mundo.

2 de mar. de 2008

Senhores do Crime


Há uma semana a Academia de Cinema americana entregou os três principais prêmios do Oscar para Onde os fracos não têm vez, filme adaptado e dirigido pelos irmãos Coen. Foi uma escolha respeitável, não só celebrando o filme em si, mas também em respeito à obra dos dois grandes diretores.

Mas mesmo com esse acerto na festa de Hollywood, acho que Senhores do Crime, filme do cineasta canadense David Cronenberg, foi um dos grandes injustiçados da noite, recebendo apenas a indicação de melhor ator para o excepcional Viggo Motersen.

Justamente Viggo Motersen. Não gosto nada dele como herói e rei da trilogia O Senhor dos Anéis, mas é necessário admitir que sua performance em Senhores do Crime é a alma do filme. Uma construção sutil, cheia de nuanças, que dá conta da complexidade do motorista Nicolai. Em minha opinião uma composição muito mais interessante do que toda aquela saliva e gritaria de Daniel Day-Lewis, em Sangue Negro. (leia texto abaixo)

É a segunda bem-sucedida parceria de Motersen com Cronenberg. A primeira foi com Marcas da Violência, uma adaptação de um comic book em que o diretor investiga facetas mais obscuras do caráter humano. Uma espécie de O Médico e o Monstro contemporâneo. Senhores do Crime parece continuar essa averiguação sobre o pior de nós.

Abrindo agora suas lentes para a máfia russa em Londres, Cronenberg fez um filme de grande rigor e calma para conduzir com mestria todas as teias de seu roteiro. Sabe conduzir muito bem seus personagens, dando-lhes riqueza e oportunidade para que todo seu elenco coadjuvante também brilhe, com destaque para Vincent Cassel e Armin Mueller-Stahl.

Não sou um grande entusiasta do filme premiado dos irmãos Coen, por mais que tenha uma admiração fria por Onde os fracos não têm vez . Já Senhores do Crime me toca fundo, e a já muito comentada luta na sauna é realmente algo para ficar na memória e na história do Cinema.

Tenho somente uma ressalva ao filme que é a excessiva ingenuidade da personagem de Naomi Watts que, mesmo na obviedade do perigo, parece enfrentar membros da máfia para que o enredo funcione. Porém nada que comprometa o resultado deste grande filme.