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29 de nov. de 2009

Julie & Julia


Julie Powel e Julia Child. Duas mulheres passionais que encontram na arte da culinária o sentido para suas vidas. Separadas por mais de 40 anos de história, “Julie & Julia” intercala façanhas dessas duas mulheres que mais do que um emprego razoável, ou um casamento feliz, queriam aprimorar no fogão receitas gastronômicas de deixar o espectador com água na boca.

O sonho de Julie (Amy Adams, de “Encantada”) era tornar-se escritora, mas por falta de confiança e planejamento não conseguiu terminar seu primeiro romance. Frustrada, muda-se com seu marido (Chris Messina) para um apartamento minúsculo no Brooklin. Para piorar, vai trabalhar num outro cubículo ouvindo reclamações quanto ao seguro de saúde para os afetados pelos ataques de 11 de Setembro.

Tentando dar uma sacudida em sua vida, Julie cria um blog para compartilhar com internautas uma ousada missão pessoal: Refazer em um ano todas as 524 (!) receitas de “Mastering the Art of French Cooking”, bíblia de receitas escrito por Julia Child (Meryl Streep) no início dos anos 60.

Entre os dilemas de Julie na cozinha nos anos 2000, “Julie & Julia” conta em paralelo a história da expansiva Julia Child, desde sua chegada em Paris em 1949. Child revolucionou a culinária norte-americana com uma série de livros e programas de televisão que fizeram imenso sucesso nas telas dos Estados Unidos. A maioria dos flashbacks detém-se em sua luta para publicar seu primeiro livro de receitas e em pequenas crônicas sobre seu feliz casamento com Paul Child (Stanley Tucci).

Meryl Streep, atestando que é uma das maiores de seu tempo, cria uma Julia Child cheia de graça e humor. O sotaque, as expressões, tudo sem excessos que poderiam beirar a caricatura. O leitor pode procurar no YouTube pelos programas da verdadeira Julia e fazer a comparação. Meryl deve mais uma vez bater cartão como uma das indicadas ao Oscar.

A diretora e roteirista Nora Ephron (“A Feiticeira”) baseou-se em dois livros para construir o projeto: “My Life in France”, de Julia Child e “Julie & Julia”, de Powel, livro escrito graças ao sucesso de público de seu blog. A idéia é boa, mas o filme sofre com as idas e vindas no tempo. Faltou um roteiro mais enxuto e melhor estruturado. As sequencias com Julia/Streep são muito melhores que todo o enredo contemporâneo, comprometido pela falta de carisma e química do casal principal.

28 de nov. de 2009

Bastardos Inglórios


Eu e mais uma dupla de amigos formamos a panela tímida daqueles que não se apaixonaram incondicionalmente pelo último filme de Quentin Tarantino.

Tarantino filma bem à beça. Não dá para negar. O rigor dos enquadramentos, o ritmo interno das sequencias. O diretor de “Cães de Aluguel” é cineasta de personalidade, sem dúvida. Mas “Bastardos Inglórios” me parece ter os mesmos problemas que “Pulp Fiction”: Forma sem conteúdo, virtuosismo cinematográfico sem substância.

“Bastardos Inglórios” pode ter momentos engraçados. Mas o quê mais? Tarantino não alcança o potencial dramático que tinha “Kill Bill”. Este, também com seu bom humor e excesso de referências, consegue, à sua maneira, pensar sobre relacionamentos, maternidade, vingança. Muito mais filme, o melhor do diretor.
“Bastardos” está bem longe de ser “obra de gênio”. Além disso, banaliza a violência de maneira incômoda e preocupante, considerando a reação da platéia em muitos momentos.

9 de nov. de 2009

Anselmo Duarte (1920 - 2009)


Morreu no fim de semana que passou o ator e cineasta Anselmo Duarte. Há dois, três anos, estava muito decidido a fazer um filme sobre ele. Juntei amigos, pesquisei, recebi autorização do filho para filmá-lo, mas acabei abandonando o projeto. Depois de ler seu depoimento em livro para o Luiz Carlos Merten, do Estadão, tive compaixão por sua trajetória de galã para ganhador da Palma de Ouro, para depois diretor frustrado e amargurado por uma vida que não teve. Abandonei o projeto, hoje lembrando, provavelmente por imaturidade. Mas valeu pela oportunidade de em alguns meses mergulhar fundo em sua filmografia.
Anselmo Duarte não foi grande, mas foi um bom diretor. “O pagador de promessas”, o filme que lhe valeu o prêmio em Cannes continua vigoroso. Atores competentes, e uma direção segura, mesmo que convencional. Tem ritmo e a cena final bate fundo.
Anselmo foi muito malhado pela crítica e pelos cineastas do Cinema Novo. Estou lendo as cartas que mandou e recebeu Glauber Rocha – “Cartas ao Mundo” – e uma carta de Walter Lima Jr. para o vulcão bainao esnoba a figura de Anselmo sem misericódia, quando relata um encontro que teve com o ex-galã da Vera Cruz. Ironiza sua falta de cultura, modo de falar, etc. Bem, frutos da estupidez que também marcou os anos 60... Com seu maniqueísmo mesquinho.
“Vereda da Salvação”, que vi muitas vezes, é seu melhor filme. E indico para quem quiser ir atrás. Planos sequencias, uma forte interpretação de Raul Cortez no papel de um fanático religioso. Merece revisão pela crítica e público. Espero que saia logo menos em DVD.
Anselmo foi um dos homens mais amargurados que já apertei a mão. Um poço de ressentimentos. Era alegre, mas ferido. Brincalhão, mas estampava no rosto os versos de Manuel Bandeira: “A vida que poderia ter sido e que não foi”.

mais sobre Anselmo Duarte:
http://pipocamoderna.virgula.uol.com.br/?p=8967

6 de nov. de 2009

Santoro e diretores amam Phillip Morris


entrevista com Santoro e diretores....

Mostra SP: I Love You Phillip Morris

Uma história de amor como você nunca viu antes. “I Love You Phillip Morris” é uma comédia sobre um casal gay formado por ninguém menos que Jim Carrey e Ewan McGregor.
Carrey é Steven Russel, um típico americano de classe média que preenche todos os requisitos do sonho americano: tem casa com cerca branca, filhos e um trabalho ideal. Desde criança, sabe que deve buscar a felicidade a qualquer preço. Custe o que custar. Após um acidente de carro que quase lhe tira a vida, Steven toma a decisão fatídica de sua vida: Sair do armário. Em sua cama de hospital, toma consciência de que deve ser verdadeiro consigo mesmo para alcançar plena satisfação e ser feliz de uma vez por todas.
Só que em plenos anos 80, quando a história se passa, já era caro ser um gay de gostos sofisticados, com direito a hotéis 5 estrelas, viagens pelo mundo e carros de luxo. Para sustentar seu novo estilo de vida, o personagem de Carrey decide virar um vigarista. Falsificando cartões, forjando acidentes em supermercados em busca de ressarcimento... Só que seus esquemas são descobertos e ele vai preso. Lá conhece o delicado Phillip Morris (McGregor). Depois de uma conversa olho no olho na biblioteca da cadeia, os dois se apaixonam loucamente.
Para viver essa paixão, Steven terá que abrir mão de um antigo amor: Jimmy, personagem do brasileiro Rodrigo Santoro. O galã faz um papel pequeno, mas de grande importância para o desenvolvimento da trama. Depois de estar bem presente na primeira hora de filme, desaparece quando entra a figura de Morris, mas reaparece na história com força quando está no estágio terminal de luta contra AIDS.
“I Love You Phillip Morris” é uma comédia com momentos hilários, mas como dá para notar com os rumos do personagem de Santoro, o filme escrito e dirigido por Glenn Ficarra e John Requa vai da comédia ao drama o tempo todo. Do choro ao riso para contar essa inusitada história de amor que, surpreendentemente, é baseada em fatos reais. “I love you Phillip Morris: a true story of life, love, and prison breaks” de Steve Mcvicker, foi a base para o roteiro da dupla de cineastas.O espectador logo percebe as imensas “licenças poéticas” para reinvenção do livro para a tela grande. Mas o verdadeiro Steven Russel realmente se passou por advogado, juiz, e diretor corporativo seja para cobrir seus gastos, seja para lutar pela libertação de seu amado Morris, que continua na prisão depois que Steven ganha liberdade.
Diferente de dramas como “Filadélfia”, e mais parecido com o tom de “Será que ele é?”, “I Love You Phillip Morris” funciona como comédia dramática despretensiosa, e se afasta da tola tentativa de fazer de seu filme instrumento para a “causa gay”, ou algo do gênero.

Mostra SP: Cinzas e Sangue


A musa do cinema francês Fanny Ardant vai para trás das câmeras e estréia na direção com “Cinzas e Sangue”. Filme sobre lutas de famílias rivais na Romênia.

Logo de início, um forte prólogo. Numa praia deserta um pai é assassinado na frente de seus filhos. Na fotografia da sequencia, um predomínio do acinzentado, logo contraposto ao vermelho sangue do homem baleado. Uma cena de impacto que sugere o que virá dali em diante: uma trágica história familiar regada a ódio, sangue e fantasmas do passado.

Ao longo da narrativa, sabe-se que o pai em questão era o esposo de Judith (Ronit Ekabetz), mãe de três filhos, que vive em Marselha. A família recebe um convite para um casamento de um parente que ainda vive na Romênia, sua terra natal. A mãe reluta em ir, os filhos insistem. Há tensão entre os quatro porque Judith não deixa claro suas razões para temer voltar à casa dos pais. Eles acabam indo, e lá uma série de segredos vai sendo revelada. Entende-se toda uma cultura de vingança e violência entre famílias rivais que disputam terras há décadas.

“Cinzas e Sangue” faz lembrar muito o brasileiro “Abril Despedaçado”, que também era sobre dívidas de sangue e honra entre clãs rivais. Mas a estréia da viúva de François Truffaut não chega nem perto da força e beleza do filme de Walter Salles.

Sendo seu primeiro trabalho, é até compreensível certa irregularidade em “Cinzas e Sangue”. Fanny Ardant tem nas mãos uma história interessante e uma complexa personagem feminina - Judith. Mas faltou maturidade para que seu filme alcançasse vôos mais altos.

O roteiro deixa pontos vagos e perde o foco em subtramas irrelevantes. Alguns atores convencem, outros se limitam a caras e bocas. Para o clímax, “Cinzas e Sangue” apela para artifícios simplistas que comprometem sua verossimilhança. No todo, um filme decepcionante.