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6 de set. de 2010

O SANGUE - PEDRO COSTA


Nunca quis falar disso abertamente, são resistências que tenho, mas o pesadelo de O sangue tinha a ver com a minha infância. Vê-se que é um filme de um tipo soltário, ensimesmado e que viveu em salas de cinema sozinho. Uma história à Truffault. Um miúdo que se abandonou ou é abandonado pela família e que passa a viver em salas a partir dos oito anos e segue por aí, infância e adolescência afora. E é também um filme feito por uma pessoa que tem medo de perder o cinema, de que a infância e o crescimento das pessoas não tenham filmes, não tenham livros e não tenham cinema e de que sua solidão não seja preenchida por isso. A biografia do realizador é essa. O filme contém uma parte escura, sórdida, aquela dos velhos credores, que eram pessoas com quem eu cruzava ou que eram do meu círculo familiar, que já eram pessoas assustadas. Esse medo hoje está cumprido: já há crianças que não sabem o que é o cinema. Sempre fui muito metafórico, mas sempre disse - principalmente quando me referia à Pide (Polícia Internacional e de Defesa do Estado) -, que havia uma polícia, havia um silêncio quotidiano.... metaforicamente era isso, o evacuar o cinema.

Um comentário:

Raphael Lima disse...

sinto-me parecido timido. muitas idas ao cinema sozinho, com o coração cheio de companhias e sensações de que o encontro se dará... se dava em um solidão, eu comigo, o um que também é dois.